Sábado, 4 de Setembro de 2010

Penúltima canção

Às vezes bem deixo andar o Tempo

mas ele não sai do lugar.

Fica a girar nas linhas da mão,

à espera de acreditar.

 

Às vezes o Tempo é vazio,

espreita e aguarda mas nunca se deita,

é uma guitarra sem a sua janela,

estrela apagada em lugar de uma vela.

 

Se pudesse olhar para ontem e ser amanhã

veria os teus dedos em mim.

 

Se pudesse acordar de olhos fechados

para tudo o que teve fim.

 

Às vezes anda demais, anda depressa

o Tempo que faz a sua promessa,

leva o teu nome com ele a fugir

corre e corre sem nunca sorrir.

 

Às vezes o Tempo devia calar-se

em silêncio estender o seu cobertor.

O Sol sobre a cama e tu em pijama

e eu entretido com o teu sabor.

 

publicado por João Villalobos às 18:18

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Quinta-feira, 3 de Junho de 2010

Naquele tempo

Naquele tempo o Sol não fazia arder os olhos e as noites

 

eram como dias,

 

apenas envoltos em mantas para que nunca terminassem.

 

No cemitérios dos automóveis estendia-me no chão

 

e as estrelas fingiam tão bem a sua luz que sugeriam palavras

 

como “Sempre”.

 

Naquele tempo havia mais paredes em ruínas e no entanto

 

qualquer tecto era uma casa.

 

 

publicado por João Villalobos às 14:50

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Segunda-feira, 31 de Maio de 2010

Nada e o mundo

Deixei uma manhã que Deus partisse

 

levando o teu nome na sacola das cartas.

 

Recordo que não chovia nem fazia Sol,

 

apenas uma sombra por cima de tudo

 

cantava desafinada a mesma música

 

do “She Loves You”.  O yeah yeah yeah

 

riscado e a pigarrear de tanta mentira

 

feria os ouvidos e eu já com os olhos fechados.

 

Apenas as mãos, agarradas para nada e o mundo.

publicado por João Villalobos às 22:59

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Terça-feira, 25 de Maio de 2010

Na varanda das noites

Fugi dessa casa por construir

 

e hoje tenho os dedos amarelos de pensar porquê.

 

Fui sem querer.

 

Onde o vento era, aí estava eu em lugar algum,

 

como se fosse

 

ou conseguisses pensar-me, ver-me sem medo,

 

assim pendurado na varanda das noites.

publicado por João Villalobos às 17:00

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Domingo, 21 de Março de 2010

Aos domingos

Aos domingos perpassam, entre as paredes,

os avisos murmurados de avós mortas.

Querem-nos bem, não o duvido jamais...

 

Mas acordam-nos a fome no coração,

a memória de risos aninhados em mantas

e sopas de pão.

 

Aos domingos éramos ainda mais bons.

Beijava-lhe a face seca na igreja húmida

e o Senhor acompanhava-nos à porta de casa,

 

caminhava sobre as águas daqueles olhos claros

nesse tempo em que a paz nos rodeava

de silêncios raros.

 

Aos domingos regressam o cheiro da laca

e do pó de arroz, feitos aviso retornam

sem culpa nem dor. Antes pedem que seja feliz.

 

Pergunto-me então sobre o desvio do caminho

e é assim que agradeço, entre pecados e omissões,

não deixar-me sózinho.

publicado por João Villalobos às 21:14

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Quarta-feira, 17 de Março de 2010

Onde os pássaros mordem

Eis que o tempo se oculta nesses lábios onde os pássaros mordem.
Retenho deles uma palavra em surdina que permanece,
húmida e respirada, odorífica e doce.
 
Por dizer descansam as certezas.
Hoje foste sal em ervas frescas, o corpo entregue feito carta.
 
Respondi-te assim, com a calma dos loucos:
Virá em breve essa primeira tarde, inteira e ofuscante.
Nesse dia a nossa música antiga tocará. E eu em ti.

publicado por João Villalobos às 11:38

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Segunda-feira, 8 de Fevereiro de 2010

London distance call

Markets fall all over

e eu sem fumar a minha cigarrilha.

That's all I care.

There's a blonde star fainting in the spotlight e o som dos talheres,

some tea on the other table & 

a nice old couple

finishing dinner, with no words left for each other.

American fathers fathers

who lost their voices somewhere in the past

or whatever...You know...

Onde estás? O omnipresente piano deste hotel que é o mundo inteiro

desatina.

And there's no will for jazz

or flirting with the charming short waitress who aks if

"Is everything ok, sir"?

 

Só um jornal cor de salmão por companhia e tu algures,

distante fonte de alegria.

 

publicado por João Villalobos às 22:03

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Segunda-feira, 4 de Janeiro de 2010

Parabéns a nós

Eis-me acordado dentro de ti.

Num soneto de Rilke,
«entre os ínfimos rumores no capim
e o sabor da hortelã».
Ao longe, sobre a falésia e as mais altas ondas
volteiam as aves, luminosas como purpurinas.

Por que afloraram esses dedos os meus lábios,
na terna certeza que só partilham os amantes?
Assim regressámos, sem receio ou cuidado,
e nem tempo tive para guardar o corpo
em qualquer recanto onde pudesse menti-lo.

Agora regresso ao sono, a outras memórias acres,
preciosas, como trufas selvagens sob o chão.

 

Publicado em Janeiro de 2007 no blogue Prazeres Minúsculos e também neste livrinho aqui.

publicado por João Villalobos às 15:02

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Quarta-feira, 11 de Novembro de 2009

Dias de bronze

Dias de bronze.

Sons que pingam e sombras vermelhas.

Todos vivemos horas que nos atravessam

de tão ausentes, na inflexível soturnidade.

 

A poeira regressa.

Memórias nas suas mãos, fragmentos de riso

e beijos de chocolate em postais vindos de perto. 

Palavras como "lembras-te" e "faz hoje anos que".

 

Avançar o tempo.

Acontecer o mistério e esse tempo parar

ou pelo menos ter o sabor de uma praia.

Dizer assim: "Agora fico aqui". E ser verdade.

publicado por João Villalobos às 22:02

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Quinta-feira, 15 de Outubro de 2009

Sílabas de Outono

 

Esta é a última escala do amor e em dia de vento percorrida.
Cada viagem desenha o seu próprio sonho,
marca a firme impressão dos dedos  em cada largada.
 
Fosse o meu desejo veloz e longo, um comboio nocturno
ou um navio antigo, desses cujo vapor aquecia à distância
os  amantes imóveis, abraçados em cais de madeira escura.
 
Esta viagem tem apenas um nome e é o teu, sílabas de Outono.
publicado por João Villalobos às 21:17

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Sexta-feira, 29 de Maio de 2009

Tudo o que falta

 

Atravessas o tempo e respiro com o teu nome dentro.
Sempre, é conhecer-te desde o primeiro Maio.
É verdade que por vezes penso onde não estou,
no agridoce alargar de cada espera.
Hoje, para que saibas, foram quase minhas as tuas mãos.
 
Ouvia o murmurar de outras viagens sobre as nossas cabeças
e enquanto falavas estremecia para longe,
como as crianças fogem da casa onde são felizes
em destino aos castelos de mais ainda,
rumo a olhos com o vento dentro e vozes de caramelo.
 
Quando contornamos as horas com a cautela dos gatos,
uma voz silenciada infiltra as palavras desnecessárias.
Ei-la que murmura impossíveis noites e manhãs de sono,
uma dança em pleno dia ou serem de cada um as nossas mãos.
Uma voz que esvoaça e diz: É tão pouco, afinal, tudo o que falta.
 
 
 
publicado por João Villalobos às 10:31

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Terça-feira, 17 de Fevereiro de 2009

Rumor apenas

O tempo encolhe-se na linhas de cor antiga,

a sépia as percorre como pauta.
 
Ouve-se a voz perdida entre as falésias,
levada pelo vento perturbado de espuma.
Ressoa na distância o adeus soprado, difuso,
já sem cor ou rosto. Rumor apenas.
 
Um adeus de oceanos sem carta que os una,
apenas rochas escavadas por dentro das tardes   
e o temor de não haver nem essa voz desvanecida.  
publicado por João Villalobos às 18:26

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Segunda-feira, 2 de Fevereiro de 2009

Uma palavra pequena

Entre todos os gestos por levitar

um existe que aproxima do céu,

que eleva e queima na passagem

como fogueira de Junho. 

 

Quando trocamos de tempo,

distendes os braços em forma de gato

e a luz reveste de mercúrio a tua pele,

com memórias futuras a semeia,

pão de Páscoa.

 

Então subo por ti adentro e vou. 

 

Fresca é essa vida que celebras

em língua desconhecida,

solar a tarde que paira sobre a cidade

com anjos nos seus degraus. 

 

O amor uma palavra pequena.

 

publicado por João Villalobos às 15:01

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Segunda-feira, 26 de Janeiro de 2009

Deste lugar

 

Bebe o sumo desta pedra. De onde vem? Para onde te leva?  
O vento desvenda esse corpo que fervilha, inquieto
fôlego de puro sangue.
 
Abro-te cauteloso, como a um livro de cabelos brancos.         
Em movimentos de violino expostas  as tuas cordas em sol,
fluem a glória e o êxtase e a água, a luz e o alimento.
 
Só no fim irrompe a descoberta,
deixa o seu lugar oculto. Parte daqui.
Deste lugar por onde ninguém passa.
publicado por João Villalobos às 15:15

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Segunda-feira, 19 de Janeiro de 2009

Quando partes

 

Qual o maior de todos os segredos,
o modo invisível de viver-te?
Há no meio da cidade um jardim e estátuas decapitadas.  
Aí os abraços partilham a lucidez do tempo, alongam-se
nas sombras impossíveis do meio-dia.
 
Quando não falo, sabes o que quero dizer-te. Sempre
as mãos em fogo,
longas e vorazes,
exactas e vivas.
 
Há dias sem ar e outros em que te respiro. São os mesmos.
De casa em casa, transporto a tua ausência em caixotes vazios.
É o mais misterioso dos mistérios, este que apenas pressinto
na íntima indiferença das estátuas sem cabeça,
nos seus impávidos olhos abertos .
Que sinto em ti, quando partes, ainda ofegante de silêncio.
publicado por João Villalobos às 11:56

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